No dia 14 de abril de 2022, a cidade de Timbó, em Santa Catarina, foi palco de um crime que chocou o Brasil. Luna Gonçalves, uma menina de 11 anos, foi encontrada morta em sua casa, no Bairro Imigrantes, antes mesmo de ser transportada ao Hospital OASE. Inicialmente, a família alegou que a morte ocorrera durante o trajeto ao hospital, mas investigações posteriores revelaram que a criança já estava sem vida quando os serviços de emergência foram acionados.
Os primeiros indícios de violência surgiram com o relato de hematomas generalizados no corpo de Luna e sangramento na região genital. A mãe, Bruna Gonçalves, e o padrasto, identificado como Jhonatan Gabryel de Jesus, foram levados à delegacia, mas liberados após afirmarem que a morte fora resultado de uma queda acidental da escada. A versão, porém, desmoronou diante de provas contundentes: exames cadavéricos comprovaram que Luna foi vítima de feminicídio, tortura continuada e estupro de vulnerável, inclusive horas antes de morrer.
Em um segundo depoimento, a mãe assumiu a autoria do crime, mas o Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) desvendou uma teia de violência sistemática. As investigações apontaram que Luna sofria agressões diárias, incluindo socos, tapas, surras com mangueiras de jardim e ameaças psicológicas, além de cárcere privado. A menina e seus irmãos — uma irmã de seis anos e um bebê de nove meses — viviam isolados do mundo exterior. A mãe justificava a reclusão citando uma suposta síndrome do pânico, que a impedia de sair de casa ou permitir que as crianças brincassem na rua.
O MPSC revelou ainda que, após o assassinato em 13 de abril, os acusados apagaram registros de celulares e limparam a residência para ocultar evidências. A mãe chegou a assumir falsamente a culpa pelo feminicídio, numa tentativa de proteger o companheiro. No entanto, laudos periciais confirmaram que Luna foi agredida no rosto, cabeça e tórax, e que o padrasto participou ativamente das violências, incluindo o estupro.
Em novembro de 2023, o Tribunal do Júri de Timbó condenou Jhonatan Gabryel de Jesus a 56 anos de prisão pelos crimes de feminicídio, tortura continuada, estupro de vulnerável, cárcere privado e fraude processual. Bruna Gonçalves recebeu pena de 14 anos por tortura continuada e omissão de socorro, mas foi absolvida da acusação de homicídio. Segundo os Promotores de Justiça Alexandre Daura Serratine e Tiago Davi Schmitt, a decisão considerou que a mãe não aplicou o golpe fatal, mas permitiu o ambiente de terror que culminou na morte da filha.
O caso expôs falhas cruciais na proteção à criança. Vizinhos relataram nunca ter visto ou ouvido sinais de agressão, mesmo com a família residindo por meses no mesmo local. A invisibilidade de Luna, aprisionada em uma casa transformada em cenário de horrores, tornou-se símbolo de um sistema que falhou em resgatá-la a tempo.
A condenação dos réus encerrou um capítulo jurídico, mas deixou perguntas sobre como uma criança pôde ser submetida a tamanha crueldade sem que ninguém interviesse. Para a Justiça catarinense, Luna não foi vítima apenas de seus algozes, mas de uma sociedade que, por silêncio ou indiferença, normalizou o intolerável.
| Projeto Comunicando ComCausa
| Portal C3 | Instagram C3 Oficial
______________

Compartilhe: